Acordamos cedo para escapar às filas que todos os dias, pela manhã, se fazem junto à Grande Mesquita de Córdoba.
As ruas, nas imediações da mesquita, já estão bastante animadas. Mas não se pense que são só os turistas que causam tal estado. Há locais que tomam o pequeno-almoço, alguns charlán nas esquinas e outros fazem a sua ginástica matinal.
Atravessarmos a Puerta del Perdón que nos leva diretamenta para o Pátio de los Naranjos, onde diversas fontes permitiam aos fiéis devotos de Maomé tratar da higiene antes das orações diárias.
A gigantesca e enigmática Mesquita de Córdoba ergue-se à nossa frente. Mas à nossa frente ergue-se também um pedaço do misterioso Gharb Al-Andalus.
O Gharb Al-Andalus adensou mistérios. Despertou outrora, e continua a despertar hoje, curiosidades e ódios. Não é raro vermos pela península fora as mais diversas lendas sobre cavaleiros e mouras encantadas. E ainda hoje a influência muçulmana da península Ibérica é sinal de discussões acaloradas.
Quando entramos na mesquita – agora, catedral – somos engolidos por um mar de pedra, de pilares que transportam o olhar até ao infinito e mesmo lá no fundo, no infinito, continuam a emergir esses pilares listados a vermelho.
Há um sentimento típico, daqueles que assombram o espírito de todos os viajantes: aquele sentimento de que, afinal, não é tão majestoso como parecia nas fotos, não é assim tão grande, nas fotos era bem mais bonito, etc…
Esquece as fotos e as histórias que lhe contaram, pois a Mesquita de Córdoba está muito para lá.
As colunas são maiores e o espaço é imenso. O sentimento recorrente é o de pequenez perante tal gigante vetusto, sábio e que encerra tanto mistério.
Arcos e Pilares – O teto da Catedral de Córdoba é apoiado por 850 colunas de mármore, granito e jaspe que criam um espetacular efeito visual.
O início da construção da mesquita de Córdoba remonta ao século VIII, sendo que a conclusão só se terminaria no século X.
A Mesquita de Córdoba foi, à altura, a segunda maior do mundo, só suplantada pela grande Mesquita de Meca. Uma das curiosidades mais apaixonantes prende-se com o facto do famoso muro da “qibla” – ou da direção – não estar orientado para Meca, como seria de esperar, mas uns 51º mais para sul, algo que se tornou habitual nas mesquitas de Al-Ándalus.
A mesquita sofreu sucessivas ampliações até se tornar esta gigantesca floresta de 850 colunas e arcos vermelhos que os cristãos encontraram, em 1236, aquando da reconquista cristã do califado da Andaluzia. (ver aqui um esquema da Catedral de Córdoba).
Depois de Fernando III, no século XIII, após a conquista de Córdoba, dá um novo usa à mesquita e transforma-a numa igreja.
Às vezes confundo-me, fico sem saber como tratá-la. É verdade que foi mesquita, mas tentaram travesti-la de catedral. Mas lá no fundo, entre as suas colunas, continuam a ouvir-se, em surdina, os versos corânicos, e o murmurar das rezas em direção a Meca.
Quando vieram os cristãos, ao contrário do que aconteceu por esse mundo fora, não tiveram, aqui, coragem de arrasar com o templo original. E sobre as colunas erguidas, forjadas pelo suor dos seguidores de Maomé, ergueram a igreja de Pedro.
Trabalho mal feito dizem alguns, necessário, outros.
A verdade é que o monarca Carlos I, este que até havia autorizado a construção da Catedral sobre a mesquita islâmica, disse quando veio conhecer a obra acabada, uma das frases que quedam nos anais da história da humanidade: “destruíram algo único no mundo para construir algo banal, ue se vê em todo o lado” (Habéis destruido lo que era único en el mundo, y habéis puesto en su lugar lo que se puede ver en todas partes).
Confesso a minha simpatia e admiração pela cultura islâmica, principalmente aqueles que, quando a Europa vivia numa idade de trevas, tiveram a ousadia de olhar para lá do comum, a ousadia de sonhar. Fizeram avanças as ciências, cultivaram as línguas e a poesia. Foram homens de artes, desses que nunca mais se haviam de fazer.
A matemática e a ciência que desde o deserto do Sahara invadiu a Europa, foi responsável pelo lançamento das bases de uma Europa mais moderna, abrindo caminho para uma das épocas mais fascinantes da história, o desbravar dos mares, a época dos descobrimentos.
Mais informação sobre a Mesquita de Córdoba em: http://www.mezquitadecordoba.org/ e também Guía personal para una primera visita a la Catedral de Córdoba
Gostei muito deste artigo. Já estive na Mesquita (sim,mesquita) de Cordoba e tive a mesma sensação de Carlos I : que aberraçãoo que os critãos fizeram !