Subir ao topo do Vulcão do Fogo foi uma das experiências mais incríveis que tivemos em Cabo Verde. São 6 horas intensas, de calor e muitas dores nas pernas, mas valeu cada escorregadela, cada gota de suor, cada grão de areia nas botas…
O Vulcão do Fogo é um vulcões mais ativos do mundo. Em 2014/2015, data da última erupção, engoliu 5 centenas de casas, destruindo quase por completo uma aldeia inteira, a Chã das Caldeiras.
E foi daqui que saímos manhã cedo, madrugada, melhor dizendo.
Quando o despertador tocou às 5:30, lá fora apenas a luz das estrelas iluminavam suavemente o Vulcão. Arrastámo-nos lentamente até à sala onde a Laeticia nos tinha preparado o pequeno almoço. Comemos ainda com os olhos meio fechados, mas com um entusiasmo crescente. Afinal, há muito que sonhávamos com este dia.
São 6 horas quando o João, aparece à porta da nosso alojamento. O João é irmão do Alcindo, o dono da pensão onde estamos alojados e que maravilhosamente nos tratou durante os dias aqui. Ele vai ser o nosso guia durante o dia de hoje.
Depois das mais recentes erupções a aldeia começou a passar por muitas dificuldades. Graças ao esforço das suas gentes, à sua resiliência e ao turismo, a aldeia vai renascendo das cinzas. Por isso, o serviço de guias a turistas é uma excelente fonte de rendimentos para os habitantes da aldeia.
No dia anterior o João falou-nos um pouco da subida e do percurso. Mais tarde, viríamos a saber, duvidou que conseguíssemos chegar ao topo e descer pelo Pico Pequeno. Diz que os portugueses são muito lentos, não gostam de caminhar. Fizemos-lhe ver que estava completamente enganado 🙂
Quando chegamos ao sopé do vulcão o dia começava a clarear. A luz ténue dava uma tonalidade cremosa à paisagem, tons negros pintalgados de verde, pelas videiras que se espalham campo fora.
No dia anterior já tínhamos vagueado por estas bandas, calcorreámos as ruas cobertas de lava e impressionámo-nos com esta imensidão negra, como aqui contámos.
Ir e vir da Chã das Caldeiras até ao Pico do Fogo demoraria cerca de 4/5 horas. Se fossemos até ao Pico Pequeno, lugar da última erupção, seriam mais 2 a 3 horas.
A primeira hora do percurso é relativamente fácil. Estava fresco. Quando se olha para trás vemos um pequeno grupo que também sobe ao vulcão.
A pedra bordeira já está completamente iluminada. A bordeira, em forma de semicírculo, e com 9 kms de diâmetro, é uma colossal parede de rochas basálticas, a pique, cuja altura chega a ultrapassar mil metros.
Paramos uma ou duas vezes, para descansar, beber água, mas acima de tudo para apreciar a magnificência das vistas cá de cima.
Vamos em passada forte. Estamos habituados a estas caminhadas, mas a pouco e pouco as pernas começam a fraquejar. Parece que o topo é já ali, mas uma parede imensa de rochas eleva-se à nossa frente.
O João vai conversando connosco, fala-nos da sua vida, da família, dos dias angustiantes em que quase todos saíram da aldeia e ele e o irmão Alcindo se mantiveram vigilantes, vendo a lava destruir as suas vidas.
Começa a cheirar intensamente a enxofre. O João lança umas palavras em tom de alento final e, de um salto, vemos a cratera do Pico do Fogo. As fumarolas lançam vapor de água, gases e um cheiro nauseabundo a enxofre.
Finalmente chegou a merecido descanso. O João está impressionado connosco. 2 horas e 15 minutos. Excelente. Agora comemos umas sandes que trazíamos na mochila e tiramos fotos, muitas.
Entretanto chega um outro irmão do João, serve de guia a um casal de italianos. Chegam os franceses e nós preparamo-nos para partir. Somos os únicos a continuar na subida. Sim, porque ainda não estamos no topo.
Aqui não se ouve nada. Estamos sozinhos de frente para a natureza pura, dura e crua. Queremos chegar ao ponto mais alto da Ilha e o ponto mais alto de Cabo Verde. Com ajuda de uns cabos fixados na rocha, a via ferrata, circulamos o monte.
Puff! Estamos no topo.
Serão precisas palavras?
Subimos 1555 metros. Se estamos cansados? Um pouco. Mas agora é sempre a descer e a parte mais divertida vem a seguir.
Fechem os olhos, imaginem descer um vulcão a correr, por um lençol de fina pedra-pomes (lapili), rebolar, cair e só pararmos lá no fundo? Pois, a nossa descida foi assim:
Cobertos de pó negro até às orelhas, chegámos ao Pico Pequeno. Existem diversos picos na caldeira principal onde, ao longo das décadas, o vulcão tem libertado pressão e expelido a sua fúria. O Pico Pequeno é um desses pico e que em 2014/2015 decidiu acordar. Expeliu lava durante semanas e arrasou casas e vidas. Parece tão pequenino e inofensivo…
Circulamos o Pico Pequeno e sentimos que a caminhada estava a chegar ao fim. Sentíamos a pele a picar do pó negro, mas sabíamos que este iríamos guardar na retina e na memória está experiência fantástica. Regressamos a casa do Alcindo para um belo banho e mais uma passeata pela aldeia. Acabámos o dia cansados de copo de vinho do famoso manecon, feito com as próprias mãos e saber de quem habita estes lugares singulares. Damos mais uma olhadela de soslaio e lá continua ele. Imóvel. É nestes lugares que nos sentimos pequenos, sentimos que somos apenas um grão de areia, quase invisível, neste planeta gigante.
- Distância: 12,32 km (pode variar consoante o percurso) – Ver o percurso no Wikiloc
- Tempo: entre 6/7 horas (consoante o percurso. Sem passagem pelo Pico Pequeno são cerca de 4h)
- Tipo de percurso: Circular
- Altitude máxima: 2779 – Altitude mínima: 1712
- Acumulado na subida: 1555m
- Dificuldade técnica: Difícil
- Preço do guia: os preços podem variar, mas rondam os 4000 ecudos para o Pico do Fogo e mais 2000 escudos se quisermos ir até ao Pico Pequeno. Apesar de ser possível ir sem guia, não tome esta opção. O caminho pode ser perigoso se não soubermos onde “pisamos”, além do mais ao contratar um guia está a contactar com as gentes do Fogo e a contribuir para a frágil economia local.