As nuvens que surgiram no horizonte, com ar ameaçador, serviram para nos lembrar que a natureza, em todas as suas condições, nos envolve e nos acompanha a cada passada!
Chegámos a Barca D’Alva ainda cedo, percorrendo as curvas descendentes desde Figueira de Castelo Rodrigo. Há gente que chega, são muitos. Roupas coloridas, bastões, bananas e no rosto, essa bem espelhada vontade de domar a linha.
As curvas descendentes que levam a Barca D’Alva
A organização da caminhada é dos The Brave Ones, amantes das linhas e das máquinas. Nós viemos com um pequeno grupo da Guarda, uns, mais do que outros, habituados às botas, às mochilas e a muitos quilómetros nas pernas.
E vão ser necessárias pernas, muitas. Afinal, serão 29 km desde Barca D’Alva até ao Pocinho, sempre tendo a linha do Douro como companhia.
Túnel de Castelo Melhor, um dos vários que vencem as arribas que se erguem nas encostas do douro.
Em jeito de bênção sentimos duas pingas a tocar-nos a pele, para logo o sol inundar as vistas das centenas de caminhantes que em modo suicídio coletivo se atiram para a linha e, ainda que acabem com vida as mazelas e os pés doridos, serão apenas danos colaterais que nos lembrarão que não há beleza que escape aos aventureiros.
Do outro lado do rio funciona já funciona o roaming e fala-se outra língua, a ponte ferroviária do Rio Águeda serve de aquecimento para os quilómetros que se avizinham. E o túnel em que acaba escuro e sombrio serve de mote para propor ideias de uma nova aventura, que possivelmente e em breve vos iremos contar.
O atraso do inicio do percurso, fará recordar os anos idos em que comboios sucumbindo à dura viagem retardavam encontros e despedidas, onde em estações se aguardava a chegadas e se matavam as saudades dos que ficaram.
A linha vai-se revelando e o seu estado de abandono em evidente, a vegetação tomou conta dos carris em toda a sua bitola. Os barrotes, alguns já desfeitos, foram consumidos pelas agruras do tempo, ficando soterrados numa calma evidente.
É uma dor de alma ver esta linha assim, deitada ao abandono. É uma dor de alma saber que não é caso único, que aconteceu o mesmo com a Linha do Corgo, do Tua, do Sabor e por aí fora….
As antigas estações, a de Barca D’Alva, Almendra e Castelo Melhor, abandonadas e isoladas revelam os vestígios do tempo em janelas e porta partidas, soalhos esburacados e paredes derrumbadas! Hoje nelas se servirão as merendas que carregamos às costas para que depois voltem ao desleixo que as acompanha.
O percurso, embora plano é sinuoso, a passada interrompida a cada metro por um novo obstáculo, dificulta as conversas, tornando-nos ofegantes, os pés sofrem no calcar da brita, na dureza do solo irregular.
Paulatinamente os caminheiros e viajantes que por aqui passam vão deixando carreiros, mas será um esforço inglório perante a força implacável da natureza que, a pouco e pouco, se vai apoderando da linha, ou do que resta dela.
O nosso almoço serviu-se na estação de Almendra, depois de 10 km percorridos. Seguimos de passo firme agarrando a paisagem nas lentes das máquinas e no visor do telemóvel, pois a memória é fraca para recordar tudo.
Chegamos a Foz Côa, sabendo que 9 longos quilómetros nos separam do Pocinho, por isso os mais resistentes seguem. Os outros poderão terminar por ali e descansar um pouco mais cedo. Nós continuamos. É cada vez mais difícil esta parte do percurso, onde os pés resvalam nas pedras do caminho e onde os olhos se colam no chão escolhendo melhor onde poisar os pés, minorando os danos.
Mas não há esforço que não dê em glória e, por volta das 8, a estação do Pocinho é invadida pela multidão.
É preciso relembrar às gentes que a linha está ainda está viva e pulsa de adrenalina, enquanto maravilha curiosos e os amantes da natureza. Os cafés enchem-se de gente e de pernas cansadas que buscam consolo num petisco saboroso ou numa bebida fresca.
Todas as fotografias da caminhada
Se quiser dar uma olhadela nas fotos que tirámos quando andámos a percorrer estes trilhos, estão todas aqui, no Facebook e num álbum do Google Photos.
Filme
(brevemente)
| Leia também |
> O percurso a pé entre Barca D’Alva e o Pocinho (o trilho, todas as dicas, distâncias, fotos e muito mais…)
> O percurso a pé entre Barca D’Alva e La Fregeneda (BREVEMENTE)
> Uma perspectiva diferente do Douro, através da Embarcação Senhora da Veiga
Fantástica descrição e optimas fotos.Parabéns e obrigado pela partilha .Espero voltar a encontrar-me com voces num caminho qualquer …Abraço .
Adorei a descrição. Relembrei tudo o que vi, tudo o que fui sentindo e guardo, até à próxima caminhada.
É possível ver alguma linha de comboio sem fazer o trilho e andar muito a pé , para pessoas com pouca mobilidade? Obrigada