Em pouco mais de 4 horas de avião havíamos de chegar à cidade da Praia. Já ia longa a noite e a única opção teria mesmo que passar pelo aluguer direto do táxi até ao nosso hotel. Íamos apreensivos com a demora na emissão do visto à chegada, uma vez que os relatos nos davam conta de enormes filas, mas talvez por ainda estarmos longe da época alta tudo se resolveu e em poucos minutos e, num ápice, já circulávamos pelas ruas da cidade com os olhares curiosos, que em ângulo de 180 º procuravam absorver o máximo da informação que nos chegava através dos cartazes que anunciavam o concerto de José Malhoa ou publicitavam os sumos Compal.
Com a diferença de apenas duas horas e trazendo na bagagem já meio dia de trabalho e uma viagem de carro até Lisboa não foi difícil cair num sono profundo que interrompemos ao primeiro raio de sol animados pela descoberta da Ilha de Santiago.
Se o pequeno almoço nos confortou, foram as expectativas da viagem que nos animaram e num pescar de olhos estávamos num táxi com outros três portugueses que por sorte encontrámos no hotel e num desenrancanso ultramarino conseguimos convencer o taxista a levar-nos aos cinco num veículo com claro excesso de carga! Se nos mandasse parar a polícia lá se iria a poupança.
Combinámos o percurso, sabendo que nos entregaríamos à boa fé e disposição do motorista, que nos guiou, apertadinhos no banco traseiro, pelas estradas em zig zague de toda a ilha .
Assomada
A simpatia do Lindo, o nosso guia pela ilha ao volante do seu carro branco, fez uma primeira paragem no Mercado da Assomada onde as cores, sabores e odores da ilha se reuniram ao sotaque criolo. As fotos ficam magnificas aos sons do colorido pregão enquanto as vistas inquisitivas tentam descobrir os nomes dos mais estranhos produtos que por aqui se vendem.
É na zona dos frescos que nos perdemos e vamos trocando sorrisos e breves palavras com as vendedoras, até à esquina onde um alfaiate se entrega ao trabalho expondo os coloridos vestidos que nos tentam a gastar alguns dos escudos que já levantamos.
Cá fora vendem-se os têxteis e roupas interiores de fabrico asiático que se podem encontrar na loja ao lado de casa, amontoam-se os artigos de plástico que vão do chinelo aos utensílios de cozinha que se confundem com os vendidos na feira semanal da nossa terra!
Seguimos até ao Tarrafal, onde confrontaremos um dos marcos mais negros da nossa história recente. No caminho , o ziguezaguedo pelas montanhas levou-nos até à Serra da Malagueta, onde se tem um fantástica vista para o vale.
Tarrafal
Chamada de Colónia Penal do Tarrafal, situada por ironia no lugar de Chão Bom, foi criada no ano de 1936 e recebeu até 1956 os presos políticos de todo um império. 32 detidos, das mais diversas origens acabaram por falecer na prisão.
Mas para saber mais e melhor aconselhamos a visita à estrutura abandonada e aos seus pavilhões que ensombram a paisagem, tal como atormentaram muitos dos detidos, que durante décadas contiveram em regimes forçados e largas penas e castigos que hoje apenas podemos imaginar! A visita a todo o complexo custa 100 escudos, mas vale pelo interesse histórico, pela possibilidade de conhecer um passado que não queremos que se repita e que ali jaz, com traços de abandono em edifícios decadentes mas que ainda albergam muitos pormenores do terror que ali se viveu.
Paramos depois para almoçar junto da praia do Tarrafal, a melhor da ilha, dizem… Encimada por árvores, é uma espécie de praia dupla que se divide por rochas, mas também por atividades. Se de um dos seus lados se trabalha, no outros descansam turistas e locais, enquanto observam as águas azuis de tonalidades diferentes consoante a nossa posição.
Podemos dizer que nesse dia a areia queimava os pés e só numa sombra conseguimos algum alívio.
Pedimos ao Lindo para no regresso nos levar por outro caminho e assim ainda conseguimos apreciar a paisagem da ilha de Santiago, que por ser mais agrícola e verde constatou com todos os tons de castanho que até então podemos observar. Em Pedra Badejo, como um oásis no deserto foram surgindo plantações de milho, de cana e algumas bananeiras que nos acompanharam no percurso.
Aproveitando a disponibilidade, a companhia e por que se tornou aprazível a viagem, ainda que isso implicasse partilhar o banco traseiro entre quatro turistas entusiasmados, acabamos a renegociar o preço do trajeto por uns quilómetros extra até à Cidade Velha e ao Real Forte de São Filipe. Nada que atrapalhasse o Lindo que apenas teve de ligar para casa a lembrar que as galinhas precisavam de alimento…
Real Forte de São Filipe
Paramos no Real Forte de São Filipe, recentemente reconstruído e recuperado para receber o turismo, para compreendermos mais acerca da história de ilha. O Celestino proporcionou-nos um agradável passeio entre as muralhas, explicando acerca da construção do mesmo, em pleno reinado Filipino, com o objectivo de afastar os piratas daquela que era uma importante cidade para abastecimento de embarcações que cruzavam atlântico em busca de riqueza e novas gentes.
Percebemos que em menos de 500 anos, toda a ilha se modificou, abandonando a cidade velha, que se ergueu à custa do trabalho escravo e se tornou num importante interposto comercial não só de seres humanos, mas também de bens, crescendo para os lados da Cidade da Praia, mais resguardada de ataques e onde se ergue o hoje a capital de Cabo Verde.
Cidade Velha
As vistas do forte mostram aos seus pés as ruínas de antigos edifícios religiosos, a visão ofuscada pelo nevoeiro da ilha do Fogo, mas também são uma lição de superação e coragem de todos aqueles que trazidos em barcos de negreiros ali foram parar acabando por se fixar forçadamente a mando de senhores poderosos que aos olhos do mundo de hoje não são mais que criminosos.
Mas é no centro da cidade velha que se ergue o Pelourinho que assinala a importância daquela terra e de muitas das atrocidades que se cometeram naqueles tempos…
É também na Cidade Velha que passeamos na Rua Bananas, a primeira rua da ilha de Santiago, de todo o arquipélago marcando esta cidade como a primeira a ser fundada na África subsariana.
Foi neste pedaço de terra que começaram a convergir as mais diversas gentes e culturas, foi aqui que se começou a desenhar o carácter das gentes de Cabo Verde.
Acertamos contas com o Lindo e combinamos já com ele a viagem para o aeroporto no dia seguinte. Como no regresso da Ilha do Fogo e antes de irmos para S. Vicente teremos ainda mais umas horas na Cidade da Praia, combinamos também com o Lindo, para que nos vá buscar ao aeroporto e nos deixe no Plateau e é assim que à hora marcada nos voltaremos a encontrar.
Cidade da Praia
Chegámos cedo do Fogo, e estamos de regresso à Cidade da Praia para umas quantas horas de descoberta da capital deste arquipélago magnífico. Desta vez o Lindo deixa-nos na avenida Amílcar Cabral e é daqui que partimos para a exploração do Plateau, o centro histórico da cidade e o seu bairro mais cosmopolita.
Mas primeiro, e porque ainda é cedo, descemos ao Mercado de Sucupira.
O mercado ferve a esta hora do dia. As barraquinhas de comida estão em pleno, insistem para comermos qualquer coisa, mas ainda é cedo! Ouvem-se os primeiros pregões da manhã. Os vendedores aprontam-se, as mercadorias são descarregadas e os alugueres apinham-se de gente de gente. Depois de uma boa meia hora, regressamos ao Plateau.
No dia 5 de julho de 1975 é proclamada a independência de Cabo Verde, para este desfecho muito contribui o Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) que lutou estoicamente pelas aspirações autonomistas e independentistas de Cabo Verde e da Guiné-Bissau. Com o advento do 25 de Abril e o fim da Guerra Colonial, a independência do arquipélago viria a concretizar-se a 5 de julho de 1975.
E é na Avenida 4 de julho que fazemos uma pausa. Sentamo-nos na Pastelaria Vilu e pedimos duas bicas. Sabe-nos como a vida. Protegemo-nos do Sol que já aquece a ilha. Os cafés ao estilo português alinham-se na principal avenida da cidade e enchem as esplanadas de cabo-verdianos e turistas.
Com as energias repostas damos um salto ao Museu etnográfico de Cabo Verde, mesmo ali ao lado. É um museu simples, mas com informação essencial para compreendermos quer a geografia, quer as gente dos arquipélago.
A caminho da Casa Museu Amilcar Cabral, o herói nacional e lutador pela independência, passamos pela Praça Alexandre Albuquerque, praça central e onde desaguam as principais avenidas do Plateau.
Antes de regressarmos à Rua Peatonal, onde almoçámos e nos despediríamos da cidade, fazemos uma visita a Diogo Gomes, que do alto do Palteau vigia a cidade, zela por ela noite e dia, qual vigilante dedicado!
- Um táxi do aeroporto até às cidade da Praia custa mais ou menos 1500 escudos, pode ser um pouco menos de dizer a viagem durante o dia ou se o seu destino for mais perto do centro.
- Facilmente damos a volta à ilha de aluguer (carrinha coletivas que normalmente saem do centro da cidade – mercado de Sucupira). Os alugueres são bastante frequentes e baratos. Por um aluguer da Praia até Assomada e daqui até ao Tarrafal são cerca de 1000 escudos. Nos, como conhecemos 3 portugueses que também iam dar uma volta pela ilha, aproveitamos e negociamos um táxi. Por um dia inteiro à volta da ilha, com paragem onde lhe pedíamos, pagamos cerca de 80€. A viagem começou na Praia, paramos na Assomada, Tarrafal, Pedra Barulho, Forte de São Filipe e terminamos já noite na Velha.
- Para andar por Santiago sugerimos o Lindo, um taxista dedicado, conhecedor da sua terra e muito divertido. Deixamos o seu facebook para entrarem em contacto com ele.
- A entrada na Colónia Penal do Tarrafal custa 100 escudos por pessoa.
- A entrada no Real Forte de São Filipe custa 500 escudos por pessoa.
- Para visitar a Casa Museu Amilcar Cabral temos de pagar uma entrada no valor de 250 escudos.
- A entrada no Museu Etnográfico custa 200 escudos por pessoa.
[…] a dar uma volta à ilha (toda a história está bem contada aqui), viemos diretos da cidade da Praia com umas pequenas paragens para apreciar a paisagem e a aldeia […]
Olá Sérgio e Sandra, adorei a vossa descrição por terras de Cabo Verde, estou desertinha para ir à ilha de Santiago, aproveitar o mar, apenas o mar, comigo própria ? quem sabe encontrarei o Lindo… Sou de Castelo Branco, portanto conheço bem os vossos f’s ?
Desejo-vos muitas e belas viagens, na melhor das companhias ?? beijinhos e abraços,
Sofia Neves
Olá Sofia, muito obrigado pela visita e pelas simpáticas palavras. Cabo Verde está no nosso top das viagens que mais gostamos. Viemos completamente rendidos. Agora com o pequeno Simão as viagens têm sido aqui por mais perto, mas estamos a planear voltar a Cabo Verde, para breve. Temos de ir à Brava e Maio… Saudades dessa morabeza ?
Um dia destes tem de nos fazer uma visita guiada por Castelo Branco… pode ser? ?
Obrigado,
Sérgio e Sandra
Olá Sofia, muito obrigado pela visita e pelas simpáticas palavras. Cabo Verde está no nosso top das viagens que mais gostamos. Viemos completamente rendidos. Agora com o pequeno Simão as viagens têm sido aqui por mais perto, mas estamos a planear voltar a Cabo Verde, para breve. Temos de ir à Brava e Maio… Saudades dessa morabeza 🙂
Um dia destes tem de nos fazer uma visita guiada por Castelo Branco… pode ser? 🙂
Obrigado,
Sérgio e Sandra
Ola! sofia! Um excelente trabalho. Eu como historiador e professor de história, congratulo com a sua visão e descrição.
Obrigada pela descrição. Adorei e ajudou muito. Vou este ano a Santiago, algo mudou, de certeza, mas já fiquei com uma ideia. Continuem a aventura e contem-nos. Um abraço aos três.