Chegámos ontem a Mérida. Além de uma visita ao imperdível Museu Nacional de Arte Romana, limitámos-nos a vaguear pela cidade, a perceber os seus ritmos. Terminámos o dias na Plaza de España, à volta das tapas e das cañas.
Reservámos o dia de hoje para visitar os mais importantes vestígios romanos que a cidade, Património da Humanidade, conserva dos tempos do império romano.
Conforme já dissemos, Emerita Augusta converteu-se num importante núcleo jurídico, económico, militar e cultural. Gozou de tal importância que em pouco tempo já era a capital da província romana da Lusitânia e um dos dois centros administrativos romanos mais importantes do ocidente peninsular.
A civilização e organização do império romano ainda hoje nos causam admiração. Há mais de dois mil anos, podíamos ir ao centro da cidade e tomar um banho refrecante. Abrir uma torneira de onde saía água fria, abrir outra e sair água quente. Mas depois, pensar na queda do império, pensar na idade média e no retrocesso civilizacional, causa arrepios. Os impérios não são eternos, a história da humanidade têm-se fartado de mostrar isso.



Já visitámos, pela Europa fora e pelo Norte de África, inúmeros monumentos e locais construídos pelos romanos, mas Mérida é sem dúvida um dos conjuntos mais imponentes e dos mais bem preservados.
Este conjunto magnífico de teatro, anfiteatro, circo, pontes e aquedutos é testemunho do esplendor e reputação que Mérida gozou na altura.
O dia amanheceu enevoado e fresco a contrastar com as temperaturas elevadas que se fizeram sentir no dia anterior. À entrada do Teatro quando íamos comprar o bilhete geral que nos permitiria aceder a todos os monumentos, informaram-nos que havia visita guiada ao Teatro e Anfiteatro Romano, pelas 11h. A visita, em conjunto com o bilhete geral, custou-nos 15€ e foi um excelente investimento 🙂
Era cedo, sobejava tempo até à visita guiada ao teatro. Aproveitámos e atravessámos a cidade até ao Circo Romano de Emerita Augusta.



O circo de Mérida permitia albergar cerca de 30 mil espectadores ávidos de corridas, convertendo este espaço num dos maiores circo de todo o império. Não é estranho o amor que os romanos nutriam pelas corridas de cavalos (principalmente com carruagens de 2 e 4 cavalos).
Os melhores aurigas (condutores de carros) eram aclamados como heróis por todo o império, um espécie de futebolistas dos tempos modernos.
Mas o maior de todos foi Cayo Apuleyo Diocles, aclamado como uma espécie de deus. Diocles nasceu na Lusitânia e provavelmente terá dado os primeiros passos no circo de Mérida, tendo atingido toda a consagração no grande circo Máximo de Roma.



Quando chegámos à entrada do teatro romano já se aglomeravam as pessoas para a visita guiada. Um dos arqueólogos e responsável pelas escavações do Ayntamento de Mérida ia ser o nosso guia. Com o seu chapéu engraçado e pose escolástica, escrevia no chão e falava com entusiasmo dos tempos áureos. Falava como se lá tivesse vivido, e ao longo desta nossa viagem pelo antigo império, parecia que os lugares iam tomando vida. Havia romanos e agitação, aurigas e cavalos, malabaristas, vendedores e charlatães.
Quando entrámos no anfiteatro romano o sol estava forte, e a luz que refletia no tom esbranquiçado das pedras feria o olhos.



O nosso guia, indiferente ao calor e ao sol incomodativo, continuava falando de gladiadores, e festas com animais. Conta-nos que estes espetáculos eram bastante caros. Ao contrário do que muitos pensam e daquilo que os filmes hollyodescos mostram, não havia lutas entre gladiadores até à morte. Formar um gladiador, alimentá-lo e treiná-lo era um negócio de tal forma dispendioso que os donos dos ludos (escolas de gladiadores) não se podiam dar ao luxo de perder um dos seus lutadores. Por isso, grande parte dos combates estavam viciados e decididos à partida.
Tratando-se de um espectáculo bastante caro, grande parte das despesas eram financiadas por “romanos” ilustres que um dia ansiavam ocupar um lugar político. Divertiam o povo, esperando colher o destes o voto…
Sobranceiro ao anfiteatro encontramos a jóia da coroa de Mérida: o Teatro Romano.



Mandado construir por Marco Agripa, genro do imperador Octávio Augusto, entre os anos 16 e 15 a.C, tinha uma capacidade para cerca de 6 mil pessoas, que se podiam acomodar entre as suas arquibancadas ou cáves, que estão divididas em três anéis. Como era comum, os anéis acolhiam diferentes classes sociais romanas que habitavam a cidade. O teatro romano é o monumento mais emblemático e dos mais visitados em Mérida. Durante o Verão, converte-se num maravilhoso cenário musical e teatral, albergando um dos mais importantes ciclos culturais da cidade.
Marco Agripa, e a título de curiosidade, foi o general máximo do exército romano. Apesar do carácter reservado, conta-se que tentou ao longo da sua vida agradar a Octávio Augusto, pai da sua esposa, na esperança de um dia vir a ser imperador.
Quando descíamos em direção ao rio Guadiana, demos de frente com um magnífico templo: o templo de Diana. Ainda que bastante similar ao templo de Diana, em Évora, este está mais completo e mais bem preservado. Este templo tem uma particularidade interessante: em pleno Renascimento, no séc. XVI, foi construído um palacete, do Conde de los Corbos, aproveitando parte do tempo. Ainda hoje são bem visíveis os arcos renascentistas da janela do que resta do palacete, bem colado ao templo.



O engenho e a capacidade organizativa dos romanos continua a surpreender-nos. Numa das calcadas desterradas recentemente, encontramos esta maravilha. Alguém adivinha o que é? É verdade, foram os romanos que, provavelmente, inventaram as rotundas. Viseu que se cuide 🙂



Se durante uns bons séculos os Romanos foram donos e senhores destas paragens, outros tantos pertenceram aos Mouros. Vindos do norte de África, a cidade foi conquistada ao fim de 14 meses de resistência. Para proteger esta pérola dos invasores, em 835 o emir Abderramão II manda construir uma espetacular fortificação, uma alcáçova.
A alcáçova ergue-se junto à ponte romana sobre o Guadiana, e constitui-se, na actualidade, em um dos melhores exemplos de construção defensiva do período muçulmano na Península Ibérica.
Das muralhas temos uma estrondosa vista sobre o rio Guadiana, partilhado, em grande parte do seu percurso por Espanha e Portugal.



Apesar do sol forte, paramos um pouco. Ao nosso alcance está uma das mais fantásticas pontes do período romano que já vimos, a ponte Romana de Mérida. Queixo caído, acho que é a melhor forma de expressar o nosso espanto. É a maior ponte sobrevivente do período romano. Inicialmente, o seu comprimento total era de 755 m com 62 vãos. Atualmente, permanecem cerca de 60 vãos (três dos quais estão enterrados na margem sul) com um comprimento de 721 m. É fantástica, não é?
Atravessamos lentamente a cidade. Ainda não era muito tarde, mas planeámos fazer a viagem até Córdoba durante o dia. Por isso, apressamos o passo.
A arte do mosaico é sem dúvida uma das mais ricas conquistas e dos maiores legados que a civilização romano nos deixou. A minúcia com que trabalhavam manualmente aquelas pequenas pedras, faz-nos corar.
Na Casa do Mithereo encontramos o magnífico Mosaico Cosmológico, uma autêntica obra prima e um dos mais interessantes e sugestivos mosaicos aparecidos no ocidente peninsular. Apesar de ter permanecido centenas de anos de baixo de terra, mostrou-nos de forma magistral o modo como os nossos antepassados concebiam o mundo e a sua criação.



O caminho para os columbarios, ainda que magnificamente ladeado por ciprestes, não é um simples local de passagem. É um convite à reflexão, um convite dirigido também a nós, viajantes, a fazermos o nosso próprio caminho.
Ao longo da estrada, encontramos diversos excertos de autores romanos. Este é o caminho de todos, até aquele lugar onde nos esperam, como diz José Saramago.



O textos falam-nos da forma como encarar a morte, mas acima de tudo como viver a vida. Atitude estóica ou epicurista?
Por muitos lugares romanos que visitemos, existe sempre uma sensação comum: espanto e admiração pelo trabalho de um povo que perdurou até aos nossos dias.
A organização das cidades e as avançadas técnicas que desenvolveram permitiu criar uma das civilizações mais avançadas de sempre, de tal forma que, ainda hoje, capta a nossa atenção, causa admiração e merece o nosso reconhecimento.
Atestamos o depósito do carro. Deixamos Mérida. Deixamos a Estremadura e Córdoba vai ser a nossa porta de entrada na Andaluzia.
Havia muito mais a contar, mas temos de largar amarras e rumas à Andaluzia. Aproveita e dá uma vista de olhos na nossa galeria de fotos de Mérida.
Maravilha,valeu!
É uma cidade a descobrir e com muito para contar. Abraço
VALEU !!!
Planejar uma viagem é um prazer a mais.
gostei muito do vosso artigo e reflecte o que vi em Mérida
Obrigada
heyy
posso usar algumas coisas daqui para um trabalho de historia? tem muita informaçao e e muito interessante!
Obrigado pela visita. Pode sim! Se puder fazer menção ao blog, melhor ainda.
abraço